O modelo de crédito amplo adotado pela Reforma Tributária, estabelecido pelo art. 156-A, § 1º, VIII da Constituição Federal, exigirá uma mudança de paradigma por parte dos contribuintes. Diversas aquisições de bens e serviços que, antes da reforma, se quer passavam pela atenção dos analistas fiscais, começarão a ficar em evidência. Antes de adentrarmos no tema, é importante analisar o dispositivo que estabelece o crédito amplo:
“Art. 156-A. Lei complementar instituirá imposto sobre bens e serviços de competência compartilhada entre Estados, Distrito Federal e Municípios.
§ 1º O imposto previsto no caput será informado pelo princípio da neutralidade e atenderá ao seguinte:
(…)
VIII – será não cumulativo, compensando-se o imposto devido pelo contribuinte com o montante cobrado sobre todas as operações nas quais seja adquirente de bem material ou imaterial, inclusive direito, ou de serviço, excetuadas exclusivamente as consideradas de uso ou consumo pessoal especificadas em lei complementar e as hipóteses previstas nesta Constituição;
(…)
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
(…)
V – sobre bens e serviços, nos termos de lei complementar.
(…)
§ 16. Aplica-se à contribuição prevista no inciso V do caput o disposto no art. 156-A, § 1º, I a VI, VIII, X a XIII, § 3º, § 5º, II a VI e IX, e §§ 6º a 11 e 13.” (Grifos nossos)
Com atenção aos grifos efetuados no texto legal, é possível inferir que, com a reforma tributária, as hipóteses de crédito não são mais exceção, são regra. Ressalvados poucos regimes específicos, tudo dá crédito, desde que o IBS e a CBS tenham sido pagos no respecivo fornecimento, exceto aquilo que for de uso e consumo pessoal. Aqui, entende-se como uso e consumo pessoal o relativo à pessoa, que foge do escopo da empresa, como os veículos para uso de diretores, bens para recreação dos empregados, entre outras hipóteses.
Nessa linha de raciocínio, podemos citar como hipóteses de crédito: serviços de contabilidade, de advocacia, de engenharia, licenciamento de software, energia elétrica, internet, serviços de limpeza, manutenção, entre tantas outras possibilidades. Se for para uso da empresa, cabe o crédito. Com essas variadas hipóteses, uma muito peculiar e que vale um comentário especial é a dos serviços financeiros. Sim, com a reforma, empréstimos contraídos, duplicatas descontadas e recebíveis antecipados passarão a dar crédito, pelo simples fato de que esses serviços também estarão sujeitos ao IBS e à CBS. Apesar de o texto constitucional ser muito tímido em relação ao procedimento para o crédito nesses casos, devemos lembrar que esse é um trabalho da lei complementar, conforme dispõe o art. 146, III, “b” da Constituição Federal.
O PLP nº 68/2024 e o Crédito sobre Operações de Crédito
O PLP nº 68/2024 teve que encarar um desafio ao regulamentar o crédito para essas hipóteses: os serviços financeiros estão sujeitos a um regime específico. Nesse regime, não necessariamente será possível se fazer uma relação direta entre o IBS e a CBS pagos em relação a um empréstimo concedido e o tomador do serviço. Isso se deve ao fato que para os empréstimos, por exemplo, se trabalha com um sistema de dedução, não de crédito, hipótese em que o prestador de serviço pode deduzir o custo de captação do dinheiro dos juros auferidos no empréstimo concedido. Não havendo possibilidade de se ligar o custo de captação exato para cada operação, o crédito acaba tendo que ser calculado por estimativa.
Nesse cenário que o art. 188 do PLP nº 68/2024, estabelece que os contribuintes do IBS e da CBS sujeitos ao regime regular que sejam tomadores de operações de crédito poderão apropriar créditos do IBS e da CBS de forma específica. Para este caso, os créditos do IBS e da CBS serão calculados pela alíquota que estão sujeitos os serviços financeiros aplicada sobre a parcela das despesas financeiras relativas a essas operações efetivamente pagas, pelo regime de caixa, que superar os seguintes montantes, após a data do pagamento de cada parcela:
I – a devolução do montante correspondente ao principal, independentemente da forma de amortização disposta no contrato, correspondente a cada parcela; e
II – o pagamento das despesas financeiras contidas em cada parcela correspondentes à taxa Selic, calculada com base na taxa de juros média praticada nas operações compromissadas com títulos públicos federais com prazo de 1 (um) dia útil.
Simplificando, como não é possível saber o custo de captação, o legislador preferiu estimar esse custo pela taxa SELIC. Por exemplo: se a parcela paga de um empréstimo é de R$ 1.800,00, mas deste valor, o valor principal é de R$ 1.400,00 e os juros calculados pela taxa SELIC são de R$ 150,00, a base para o crédito de IBS e CBS é justamente a diferença, de R$ 250,00. A partir daí, basta aplicar as alíquotas específicas sobre esse valor e obter o crédito devido.
Caso seja possível fazer essa vinculação individualizada do IBS e da CBS pagos pela instituição financeira com o empréstimo contraído, nesse caso, será possível tomar o crédito diretamente, sem esse cálculo estimado, nos termos do art. 189 do PLP nº 68/2024.
Por fim, é importante lembrar que o crédito nesse caso se dá pelo regime de caixa, conforme os valores efetivamente pagos ao fornecedor do serviço financeiro respectivo.
Fonte: Editorial ITC Consultoria.